Em 2001, a primeira conferência da ONU contra o racismo e o ódio aos estrangeiros, realizada em Durban, na África do Sul, gerou profundas divisões entre os participantes nos debates sobre as questões de antissemitismo, colonialismo e escravidão.
Na ocasião, os EUA e Israel se retiraram da conferência, protestando contra o tom da reunião, após alguns países tentarem incluir, na ata do encontro, uma equiparação do sionismo ao racismo, revivendo uma deliberação da própria ONU, de 1975, que foi revogada em 1991.
Com o detalhe de que alguns participantes receberam cópias dos Protocolos dos Sábios de Sião, infame libelo antissemita.
No entanto, a declaração final e o programa de ação produzido a partir do encontro não continha o texto a que os EUA e Israel se opuseram.
Anos depois, em 2009, as divisões continuavam presentes quando, em Genebra, vários representantes de países europeus se retiraram da Conferência de Revisão de Durban (Durban II) durante um discurso ultrajante do então presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad. Do púlpito central, Ahmadinejad qualificou o Holocausto como “questão ambígua e duvidosa”.
Em 2011, na conferência que marcou os dez anos de Durban, a lista de países ausentes aumentou: Alemanha, Austrália, Áustria, Bulgária, Canadá, Estados Unidos, República Tcheca, França, Israel, Itália, Holanda, Nova Zelândia, Polônia, Reino Unido. Eles acusaram o processo de ser usado para promover o racismo, a intolerância, o anti-semitismo e a negação do Holocausto, além de questionar o direito de Israel de existir.
Na próxima quarta-feira, 22/09, será realizada a próxima conferência (Durban IV), celebrando os 20 anos do primeiro encontro. Israel e muitos outros países – são 19 ao total –, como EUA, França, Reino Unido e Canadá, já anunciaram o boicote.
Porém, colocando-se à parte (mas não de lado) as declarações antissemitas ocorridas em reuniões anteriores, a conferência de Durban foi um marco importante na luta contra o racismo, com implicações significativas no Brasil e no mundo.
Como escreveu Atila Roque, historiador, cientista político e diretor da Fundação Ford no Brasil, a declaração e o plano de ação de Durban se constituem, talvez, no documento mais completo a tratar dos dilemas colocados pelo aumento da intolerância e do racismo; em certa medida, Durban quebrou o silêncio global sobre o racismo e permanece sendo um guia importante na luta por igualdade. Temas como reparação, além das responsabilidades dos governos, ganharam uma relevância até então inédita.
No Brasil, a mobilização de atores governamentais e não-governamentais, especialmente as organizações do movimento negro, abriram um leque completamente novo de possibilidades para o enfrentamento da questão – principalmente com o início das políticas de ação afirmativa nas universidades, e a criação da Secretaria de Promoção de Igualdade Racial, hoje incorporada ao Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.
As origens de nosso mal-estar
Durban foi um ponto de inflexão na relação entre movimentos negros e comunidades judaicas, colocando-os em campos opostos.
Por isso, é preciso sempre lembrar que as lutas antirracista e anti-antissemita não são e nem podem ser antagônicas. Pelo contrário. Elas tratam de temas urgentes e universais que atravessam a pauta do Instituto Brasil-Israel (IBI) e remetem a um diálogo entre judeus e negros que encontra raízes históricas.
É com esse espírito que o IBI está promovendo, em parceria com a Companhia das Letras, o debate “Casta: um novo conceito para a compreensão e o enfrentamento do racismo brasileiro?”, com Lilia Schwarcz, professora de antropologia da USP, Thiago Amparo, professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP, e mediação de Michel Gherman, professor de sociologia da UFRJ e assessor acadêmico do IBI.
A proposta da mesa é discutir as principais ideias presentes na obra “Casta – as origens de nosso mal-estar”, de Isabel Wilkerson, que acaba de ser lançada. A noção de casta, proposta pela autora, estabelece pontos de contato entre a escravidão norte americana, o nazismo alemão e o sistema indiano. E como essas hierarquias rígidas e arbitárias dividem grupos sociais ainda hoje. “A casta é a ossatura, a raça é a pele”, escreve a autora.
O que sustenta mesmo um sistema de castas, para Wilkerson, é a ideia de superioridade. Estas seriam as origens de nosso mal-estar, por suposto.
Confira os destaques da última semana!
A arte de perdoar: “O perdão é um catalisador que cria a ambiência necessária para uma nova partida, para um reinício”, dizia Martin Luther King. O episódio desta semana do podcast “E eu com isso?”, apresentado por Anita Efraim e Amanda Hatzyrah, foi sobre o principal legado do Yom Kippur, o Dia do Perdão, celebrado no último dia 16. Com a participação do rabino Adrian Gottfried, e das rabinas Fernanda Tomchinsky e Luciana Lederman, da Comunidade Shalom. Ouça.
Um bom começo: Daniela Kresch, colaboradora do IBI, escreveu um artigo para a Folha de S. Paulo mostrando como a coalizão atual que governa Israel, que vai da direita nacionalista à ultraesquerda, surpreende ao priorizar o que os une e deixar diferenças para depois. Leia.
Israel e Egito mais próximos: O primeiro-ministro de Israel, Naftali Bennett, esteve no Egito, onde encontrou-se com o presidente Abdel-Fattah al-Sissi. É a primeira reunião pública formal entre os líderes dos dois países em uma década. Na pauta, questões bilaterais e esforços para reviver o processo de paz entre Israel e os palestinos. O colaborador do IBI Daniel Gateno escreveu sobre o encontro. Leia.
Estudos Judaicos: Estão abertas as inscrições de ouvintes para o Congresso Nacional de Pesquisadores em Estudos Judaicos 2021, a ser realizado entre os dias 5 e 8 de outubro de 2021, com o apoio do IBI. Além das dezenas de apresentações temáticas, serão realizadas homenagens às professoras Rifka Berezin e Anita Novinsky, uma palestra do escritor e pesquisador Lira Neto e uma apresentação da Orquestra Laetare. Inscreva-se.
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