IBINews 218: Campanha contra o nazismo

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Se havia ainda quem nutrisse alguma desconfiança com relação ao florescimento do estigma nazista na sociedade brasileira nestes estranhos tempos, tema que infelizmente nunca deixou de estar em evidência na pauta do IBI, esta cortina de fumaça se dissipou ao longo da semana.

O Brasil acordou assustado na manhã da última terça-feira, quando relatos sobre um episódio do Flow, podcast que conta com mais de 3,5 milhões de seguidores no YouTube, ganharam repercussão nas redes.

“O nazista tinha que ter o partido nazista reconhecido por lei”, disse o apresentador Monark. “Se o cara quiser ser um anti-judeu, eu acho que tinha direito de ser”.

A fala seria deplorável em qualquer contexto. Mas torna-se ainda mais grave num momento em que as células nazistas no país vêm se multiplicando. No Brasil de hoje, “nazista” está longe de ser mera figura de linguagem para denotar uma opinião radical.

O Instituto Brasil-Israel respondeu.

Ao lado de outras organizações, como o Judeus pela Democracia, instou patrocinadores do programa a retirarem o seu apoio.

Ao Yahoo! Finanças, o Diretor do IBI Daniel Douek justificou a ação. “Pressionar plataformas e patrocinadores pelo estabelecimento de critérios e padrões de publicação, em vez de insistir na tentativa de convencimento daqueles que emitem discursos discriminatórios é muito mais efetivo. É a diferença entre atuar no varejo ou no atacado”.

A campanha viralizou, tendo sido destaque em jornais e revistas como O Globo, Veja, MyNews e até o israelense Jerusalem Post, além de inúmeras páginas na internet, como UOL, IG e Mídia Ninja

Horas depois, os dois patrocinadores, Flash Benefícios e Insider Store, anunciaram a suspensão dos contratos.

Em paralelo, personalidades públicas manifestaram o seu repúdio. O jogador Zico recusou-se a participar de uma entrevista que já estava agendada. Dan Stulbach, Tico Santa Cruz, Gabriela Prioli, Benjamin Back, Lucas Silveira, MV Bill, João Gordo e dezenas de outros pediram a retirada de suas entrevistas do ar. A Federação de Futebol do Rio de Janeiro decidiu suspender o contrato de direitos de transmissão do campeonato carioca, que havia sido celebrado com o canal.

O programa em questão contava com a participação dos deputados federais Kim Kataguiri e Tabata Amaral.

Kataguiri endossou a fala de Monark, dizendo-se contrário à criminalização do partido nazista na Alemanha. Para ambos, sufocar o debate faz com que grupos extremistas cresçam na escuridão e não sejam devidamente combatidos e rechaçados.

Tabata reagiu: “Liberdade de expressão termina onde a sua expressão coloca a vida do outro em risco”. Mas sua participação também foi contestada: por não ter abandonado o estúdio durante o debate e, principalmente, por ter publicado uma foto ao lado dos demais participantes, ao final do programa. 

Tabata viria a retirar a fotografia do ar e assumir o erro por tê-la tornado pública, em live promovida pelo IBI na quinta-feira, com o Coordenador de Comunicação, Morris Kachani. 

A live abordou a deturpação do conceito de liberdade de expressão, e como isso se projeta a outras minorias dentro de um olhar mais amplo sobre racismo.

NÃO BASTA NÃO SER NAZISTA

Monark  e Kim não são essencialmente nazistas ou antissemitas. Mas é preciso rechaçar sua tentativa de abrir espaço para a circulação e institucionalização desse tipo de discurso em nossa sociedade.

Vale lembrar: na Alemanha, o nazismo nasceu como um ideário no início do século XX, alcançou o poder em 1933 e apenas em 1941 colocou em ação a Solução Final, que exterminou seis milhões de judeus.

Em outras palavras, nazismo não começou com Auschwitz.

Sejamos claros: já não se podem atirar os cacoetes nazistas que aparecem retratados diariamente no noticiário para debaixo do tapete, sob a argumentação enviesada de se estar incorrendo na banalização do Holocausto, como se este processo histórico não servisse também como aprendizado para ser apropriado nos dias de hoje.

“O nazismo passou por um processo de normalização pública, o nazismo não está mais interditado”, afirmou o assessor acadêmico do IBI, Michel Gherman, em longa entrevista ao jornal Nexo.

Seja através de gestos obscenos do líder máximo da Nação ou em programas no YouTube e na TV perigosamente imantados pelo negacionismo, há um processo em curso de deterioração dos valores da democracia, com o uso deturpado de conceitos caros à civilidade e o emprego obtuso de falsas equivalências, como a ideia de se comparar o nazismo ao comunismo.

Além disso, é preciso ter cuidado com um fenômeno cada vez mais comum: o antissemitismo pró-Israel. “O discurso ‘pró-Israel’ e de ‘amizade’ com os judeus pode conviver muito bem com o antissemitismo”, afirmou o Coordenador de Programas e Projetos do IBI, Rafael Kruchin, em artigo para o jornal O Globo. 

Para nós do IBI, o trabalho de esclarecimento e denúncia precisa ser feito de forma integrada e contínua, incisiva e educadora. 

E assim seguimos.

Neste domingo, às 19:30, Michel Gherman participa do programa GloboNews Internacional falando sobre a ascensão do neonazismo pelo mundo e como combatê-lo.

E para quem deseja reunir um conhecimento mais aprofundado sobre o tema do antissemitismo, estamos lançando, com o Centro Cultural Mordechai Anilevitch, um curso online sobre o assunto, reunindo os professores Francisco Carlos Teixeira da Silva, Karl Schurster, Alana de Moraes Leite, Rosiane Rodrigues e Michel Gherman. Inscreva-se. 

CONFIRA OS DESTAQUES DA SEMANA!

Israel e Turquia: No Expresso Israel, as jornalistas Isabella Marzolla e Daniela Kresch conversaram sobre a recente reaproximação entre Israel e Turquia. Desde a posse do primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdoğan, os dois países têm vivido uma diplomacia conturbada. Mas os ventos parecem estar mudando. Assista.

O golpista do Tinder: Em um aplicativo de relacionamento, o estelionatário israelense Shimon Hayut se passava pelo magnata Simon Leviev. Depois que conquistava a confiança das mulheres, dizia que corria perigo e pedia dinheiro. Foi assim que roubou mais de US$ 10 milhões. Como ele está agora? Este foi o assunto do texto da semana da jornalista Daniela Kresch. Leia.

Ainda sobre o apartheid: O conceito de “Apartheid” foi criado e ganhou notoriedade a partir do regime de segregação racial na África do Sul, no século 20. No início deste mês, a Anistia Internacional divulgou um relatório em que classificou como “apartheid” a política de Israel em relação aos palestinos. No “E eu com isso?”, Anita Efraim e Rafael Kruchin conversaram sobre o tema com Omar Ribeiro Thomaz, professor da Pós-Graduação em Antropologia Social e em História na Unicamp. Ouça. 

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