Entrevista: Noemi Jaffe

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Noemi Jaffe é escritora, doutora em Literatura Brasileira pela Usp, professora e crítica literária. Entre seus livros publicados, “O que cegos estão sonhando?” trata da temática do Holocausto em três gerações de mulheres da mesma família.  

Noemi foi convidada pelo IBI a responder algumas perguntas sobre a relação de judeus na diáspora com Israel. 

Abaixo, os principais trechos da entrevista. 

Como vê a relação entre os judeus da diáspora e Israel?
Essa pergunta é complicada, porque os judeus sempre estiveram na diáspora. Me parece que o lugar dos judeus é mais na diáspora do que numa terra. Mesmo depois da criação do estado de Israel, em 1948, muitos judeus ainda permanecem na diáspora porque já tinham formado uma vida. Também porque uma grande parte dos judeus e do próprio judaísmo é viver na diáspora. Eu não acho que o judaísmo tenha a ver com morar em Israel, necessariamente. Porque o sentimento judaico e a cultura judaica é algo muito arraigado. Agora temos duas opções: viver lá ou não. Mas acredito que viver na diáspora é tão judaico quanto viver em Israel. Eu não moro lá e me sinto super judia. 

Por que não tem vontade de mudar para Israel?
Nasci no Brasil, eu me sinto muito brasileira. Tenho uma irmã que mora em Israel, gosto muito de lá. Gosto que exista Israel. Mas acho que ser israelense não é uma questão só judaica, é uma questão de cidadania e uma questão linguística. Então, judeus que nasceram em outros países, muitas vezes se identificam com o seu país. Existem outras características identitárias além do fato de ser judeu, e essas características são tão importantes quanto ser judeu ou como manter o seu judaísmo na diáspora. Inclusive eu acho que é um jeito de ser judeu, estar na Diáspora.

Acredita que há uma distorção do uso da palavra sionismo?
Eu acho sim. Assim como existe uma distorção na ideia de judaísmo e de Israel. Muita gente, pelo menos aqui no Brasil, ainda confunde ser israelense com ser judeu. Também acho que existe essa mesma confusão com relação a palavra sionismo, porque se você diz que você é sionista, acham que você é a favor do governo israelense. Acho que essa distorção tem fundamentações históricas. O sionismo tem a ver com concordar com a existência do estado de Israel. Então, nesse sentido eu posso dizer que eu sou sionista, embora eu não tenha intenção de ir para lá. Não tem a ver com o Sion, voltar à terra de Jesus, também não tem a ver com “Ah, Israel tem precedência sobre aquele lugar porque está lá há mais tempo”. Eu acho esse argumento horrível, porque senão aqui no Brasil ninguém poderia discutir com os índios. Eu trabalho com o presente e o fato é que no presente existem mais de 10 milhões [6,5 milhões] de judeus lá. Que formaram o país com tudo que qualquer país tem. Assim como existem milhões de palestinos lá.  Por isso que eu sou a favor de dois estados para dois povos. 

Como vê manifestações antissemitas que usam Israel como desculpa?
Eu sou muito contrária. Eu acho que misturam sionismo com antissemitismo. Muitas vezes acham que estão se manifestando contra Israel e, na verdade, estão se manifestando contra os judeus. Acho que algumas desculpas contra Israel são confundidas com preconceitos contra os judeus. Existem pessoas que sabem separar, mas são poucas. E, na carona delas, existe um monte de gente que não sabe. Acham que só pelo fato de você ser judeu e de eventualmente ser sionista você já é contra os palestinos. Na maioria dos casos, não quero dizer em todos, Israel é usado como desculpa, sim.

Existe uma má interpretação desse conceito.
Sim. E eu, por exemplo, sou uma pessoa de esquerda. Sempre vou estar na esquerda, continuar lutando na esquerda. E sou, às vezes, mal-vista na esquerda. Já cheguei a romper amizade com pessoas de esquerda porque ficam comparando o sionismo com o nazismo. E existe desinformação. Os judeus são historicamente de esquerda.  Então a gente está numa posição em que a gente é atacado dos dois lados.

Como é a sua relação com Israel? Acompanha a política do país? Como vê o conflito israelo-palestino?
Acompanho de longe. Tenho uma irmã que mora lá, e tenho um filho muito atuante no Hashomer Hatzair,  que é uma entidade juvenil judaica. E, por exemplo, a minha irmã lá em Israel não é de esquerda, porque a esquerda e a direita em Israel são muito diferentes do que são aqui, mas ela é totalmente contra o Bibi. E acho que lá em Israel tem quem seja a favor dele, e ele tá sendo acusado de corrupção. Mas tem pessoas que querem que ele caia, rápido, assim. Meu filho gosta muito do Meretz, desse partido, mas eu sei muito pouco. Confio cegamente nas posições do David Grossman e do Amós Oz… Eles estão sempre em oposição à situação, estão sempre no lugar de resistência, e têm um projeto de paz não idealista, não utópico, possível, plausível, e que inclui, além de um monte de outras coisas, a solução de dois estados. 

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