Revital Poleg
Os cidadãos de Israel acordaram esta manhã com uma notícia alarmante – Israel retomou a guerra em Gaza. A maioria de nós ficou horrorizada com essa decisão, sob todos os aspectos, e acima de tudo, pelo medo profundo em relação ao destino dos 59 reféns que ainda estão lá, sendo que 24 deles ainda estão vivos. Neste momento, os ataques são realizados pelo ar, mas as declarações belicistas do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e do ministro da Defesa Israel Katz levantam temores de que isso seja apenas o começo.
De acordo com as informações divulgadas, Donald Trump deu “luz verde” a Israel para realizar ataques na Faixa de Gaza após o Hamas se recusar a libertar os reféns. Esse respaldo certamente é muito conveniente para Netanyahu, que nunca escondeu sua oposição à implementação da segunda fase do acordo de libertação dos reféns.
O argumento israelense é que a retomada da guerra tem o objetivo de pressionar o Hamas a voltar à mesa de negociações. No entanto, se “negociar” significa retornar à proposta de cessar-fogo de Steve Witkoff, que não garante de forma alguma a continuidade do governo do Hamas em Gaza, o grupo terrorista não tem nenhum incentivo para voltar às negociações. Se esse for o cenário, uma incursão terrestre é apenas uma questão de tempo.
Na prática, o que aconteceu esta noite redefiniu as prioridades do governo – a destruição do Hamas foi colocada acima da libertação dos reféns.
As famílias dos reféns vivem um medo avassalador, difícil de expressar em palavras. 59 reféns ainda estão em Gaza, 24 deles ainda vivos, e sua libertação não apenas parece cada vez mais distante, mas também intensifica o maior temor: que todos os reféns acabem se tornando um “Ron Arad”, que nunca voltou para casa.
Todos os sobreviventes que retornaram do cativeiro descreveram as condições brutais a que foram submetidos, incluindo abusos, torturas e o agravamento de sua situação já precária devido aos ataques das FDI nas áreas onde estavam detidos. Muitos reféns morreram sob fogo amigo das FDI, enquanto outros foram assassinados pelo Hamas como represália às operações militares.
Na prática, a medida adotada por Israel definiu, de maneira concreta, as prioridades do governo – a destruição do Hamas foi colocada acima da libertação dos reféns.
Mas isso não é tudo. Poucas horas atrás, foi anunciado que Itamar Ben-Gvir, que havia deixado o governo em 19 de janeiro devido ao acordo de troca de reféns, está retornando ao governo. Vale lembrar que, ao anunciar sua saída, Ben-Gvir estabeleceu suas “condições” para voltar: a demissão da Procuradora-Geral de Israel, a destituição do chefe do Shin Bet, Ronen Bar, e a retomada da guerra total em Gaza logo após a primeira fase do acordo (que originalmente previa três fases), incluindo a suspensão da ajuda humanitária. E agora, quase todas essas condições já foram atendidas.
Coincidência? Certamente não!
Apenas minutos após a mídia divulgar a volta de Ben-Gvir ao governo, o jornalista Amit Segal revelou que o acordo para seu retorno já havia sido assinado em 13 de março – ou seja, tudo já estava planejado com antecedência.
E tem mais… O dia 31 deste mês marca o prazo final para a aprovação do orçamento do Estado para 2025. Como isso se relaciona com o retorno de Ben-Gvir? Aqui está a explicação: em circunstâncias normais, o orçamento deveria ter sido aprovado entre outubro e novembro de 2024. Se não for aprovado, o governo cai automaticamente, conforme determina a lei. Esse é o maior pesadelo de Netanyahu, e fica cada vez mais evidente que ele está disposto a qualquer coisa para evitar esse cenário.
Sem Ben-Gvir no governo, Netanyahu teria apenas 61 votos na coalizão, incluindo os dos partidos ultraortodoxos – que estão furiosos com ele devido à exigência do sistema de defesa israelense de recrutar membros da comunidade haredi, algo que consideram inaceitável. Nem mesmo os bilhões de shekels em fundos de coalizão distribuídos por Netanyahu para apaziguar esses partidos foram suficientes para conter sua indignação. Esses recursos foram concedidos às custas de diversas necessidades sociais urgentes da população israelense, incluindo as famílias dos reféns, os deslocados e os reservistas – todos severamente prejudicados pelos cortes.
Diante do risco de “desertores” que poderiam votar contra o orçamento no último momento, Netanyahu concluiu que precisava desesperadamente trazer Ben-Gvir de volta ao governo – e foi exatamente isso que ele fez.
O retorno de Ben-Gvir ao governo, somado ao fato de que suas exigências estão sendo gradualmente atendidas, representa um motivo de grande preocupação quanto ao rumo que este governo está tomando. Isso sem mencionar os perigosos projetos de lei que a coalizão está atualmente promovendo, os quais, na prática, minam a natureza democrática do Estado de Israel.
Amit Segal, conhecido por sua proximidade com fontes dentro do gabinete do primeiro-ministro, também foi o primeiro a divulgar a informação sobre uma ligação de 14 minutos ocorrida na noite de domingo (16 de março), na qual Netanyahu informou Ronen Bar, chefe do Shin Bet, sobre sua decisão de demiti-lo.
Além de atender à exigência de Ben-Gvir para retornar ao governo, a decisão de Netanyahu de demitir Ronen Bar neste momento específico parece estar diretamente relacionada ao fato de que o Shin Bet abriu uma investigação sobre o escândalo conhecido como “Qatar-Gate” – uma trama que envolve altos funcionários do gabinete de Netanyahu e seus supostos vínculos questionáveis com o governo do Catar, enquanto ainda ocupam seus cargos.
Netanyahu, que rapidamente negou qualquer envolvimento, é notoriamente paranoico e meticuloso – nada acontece em seu gabinete sem que ele esteja a par. A única maneira de impedir que essa investigação chegue até ele seria demitindo o chefe do Shin Bet, enviando assim um recado claro a qualquer futuro sucessor: quem ousar continuar a investigação poderá ter o mesmo destino.
Vale lembrar que Netanyahu jamais assumiu qualquer responsabilidade pelo fracasso de 7 de outubro e segue se recusando terminantemente a estabelecer uma comissão nacional de inquérito, conforme exige a lei.
O ritmo das notícias em Israel é um dos mais acelerados do mundo, mas, às vezes, superamos até nossos próprios recordes, tornando quase impossível acompanhar o fluxo de eventos. Esse é exatamente o caso dos últimos dias. Enquanto este artigo está sendo escrito, novas informações continuam surgindo, tornando o quadro ainda mais alarmante e incerto.
Após a demissão de Ronen Bar, os movimentos de protesto rapidamente se organizaram para uma série de manifestações que começaram hoje (18 de março) e continuarão amanhã, na data originalmente prevista para a votação de sua destituição pelo governo. Temendo o ressurgimento dos protestos que tanto o assombraram no passado, Netanyahu está tentando contê-los – a ponto de parecer que está lutando contra seu próprio povo. Ele tentou confundir a opinião pública alterando o horário da reunião do governo destinada a aprovar a demissão: primeiro antecipando-a, depois adiando-a novamente. No momento em que este artigo é escrito, ainda não está claro quando exatamente essa votação ocorrerá.
A manifestação planejada contra a demissão de Ronen Bar ganhou hoje uma dimensão ainda mais significativa devido à retomada da guerra e ao medo real e iminente pela vida dos reféns.
Em Tel Aviv, várias manifestações ocorrem nesta noite. De maneira extraordinária e profundamente comovente, quase todos os reféns que retornaram do cativeiro em Gaza compareceram à Praça dos Reféns, erguendo um grito desesperado por um esforço real para retomar as negociações e garantir a libertação daqueles que ainda permanecem sequestrados.
A indignação popular contra Netanyahu e seu governo está se intensificando. O que está claro é que os protestos estão voltando – e talvez, apenas talvez, isso seja um pequeno motivo para otimismo.
Esse texto não reflete necessariamente a opinião do Instituto Brasil-Israel.
(Foto: Flickr/IDF)