Revital Poleg
O norte de Israel sempre foi considerado uma joia verde, com paisagens exuberantes e comunidades ricas em história e sionismo, além de uma população maravilhosa, resiliente e determinada. Desde o dia 7 de outubro, essa região, antes tão vibrante, está passando por um processo contínuo e devastador, que está transformando suas paisagens verdes – florestas, vales, montanhas e suas encostas – em um cenário sombrio, com nuvens de fumaça, chamas e incêndios surgindo de todas as direções. Ninguém mais tenta apagar os incêndios. É perigoso demais, e a qualquer momento pode surgir um novo foco de fogo, causado pelos mísseis ou foguetes que o Hezbollah lança diariamente, em dezenas e até centenas.
Essa região agrícola fértil, uma das mais importantes para a agricultura de Israel, está agora abandonada. Não há quem cuide dos campos, quem colha as uvas nos vinhedos e pomares, quem cuide dos galinheiros, do gado ou das ovelhas. Os poucos que ainda se recusam a abandonar suas casas fazem isso correndo um risco real e imediato de vida. Mesmo que essa descrição pareça triste e dramática, ela está longe de retratar a realidade, que é ainda mais dura e que se agrava a cada dia.
Todos os kibutzim, moshavim, cidades e conselhos locais da região fazem parte dessa realidade, e cada um deles tem sua própria história única. Tomemos como exemplo Metula, o município mais ao norte de Israel, fundado em 1896 e localizado bem na fronteira com o Líbano. A cidade sempre teve uma posição estratégica crucial. Hoje, porém, Metula parece uma cidade fantasma do Velho Oeste, onde tudo o que restou são escombros. A maioria das casas, prédios e infraestruturas está destruída ou queimada. Mesmo limpar os destroços levará tempo, pois chegar até lá é um risco de vida real.
Esta é a mesma Metula onde, em janeiro de 1976, com o início da segunda guerra civil no Líbano, foi aberto um portão humanitário sob a orientação do então ministro da Defesa, Shimon Peres. Conhecido como “A Cerca Boa”, esse portão permitiu que milhares de moradores do sul do Líbano recebessem assistência civil, médica e econômica em Israel (serviços postais, transporte de mercadorias e mais), incluindo a acolhida de libaneses que optaram por se deslocar para Israel em busca de refúgio e proteção como refugiados.
Outro exemplo é o belo kibutz Manara, fundado em 1943 com o sonho de uma boa vizinhança com os libaneses ao seu lado, uma relação que durou vários anos e depois cessou. Desde 7 de outubro, essa comunidade próspera e bonita se transformou em uma zona militar fechada, abandonada por seus moradores, entre eles Rachel Rabin, irmã de Yitzhak Rabin, de 99 anos, que ainda espera poder voltar para casa. Cerca de 75% dos edifícios do kibutz foram danificados, as estradas foram esmagadas pelas lagartas dos tanques, e os membros da comunidade se dispersaram por toda parte.
O mesmo pode ser dito sobre os conselhos locais, moshavim e outros kibutzim ao longo da fronteira com o Líbano. Para eles, esta guerra já é considerada a terceira guerra do Líbano.
A guerra atual não começou como a Primeira Guerra do Líbano. Ela é diferente, e vamos orar para que também não dure tantos anos quanto aquela (18 anos, para quem se lembra). Ela também não se assemelha à Segunda Guerra do Líbano, que foi inicialmente chamada de “operação” para, aparentemente, diminuir sua escala. A Terceira Guerra do Líbano já se estende por quase 11 meses, sem sinais de trégua. O Hezbollah continua a intensificar seus ataques, caracterizando-se pela terrível destruição que semeia no norte e pelas graves consequências da evacuação dos moradores, que ainda está longe de ser concluída.
Esta não é a primeira vez que Israel evacua seus habitantes durante uma guerra. Na Guerra do Yom Kippur, os kibutzim e moshavim das Colinas de Golã foram evacuados quando cresceu a estimativa de que as vidas dos residentes no Golã estavam em perigo. No entanto, naquela ocasião, a evacuação foi breve (apenas 18 dias) e não deixou danos significativos à população.
A situação hoje está longe de ser semelhante. Não há dúvida de que a realidade atual, desde o dia 7 de outubro, quando as comunidades ao redor de Gaza foram evacuadas após o massacre, e no dia seguinte foi decidido evacuar as comunidades do norte, devido ao temor de outro massacre, coloca em grande questão o ethos israelense de que os kibutzim, moshavim e municípios são um ativo de segurança.
Oficialmente, o conflito atual no norte de Israel nem sequer é classificado como uma guerra. No máximo, é denominado neste estágio como “guerra de baixa intensidade”, como se a semântica pudesse alterar a realidade. Na prática, o Hezbollah ataca a região norte incessantemente, lançando mísseis e foguetes em uma escala de 150 ou mais por dia (!), visando alvos cada vez mais amplos. Após o ataque da Força Aérea em 25 de agosto, eles já lançaram 320 foguetes e drones em menos de três horas por toda a região norte. A escala de destruição, incêndios e também de baixas humanas cresce proporcionalmente.
Israel também ataca o Líbano e a Síria, mas a estratégia adotada é, na maior parte, reativa, e os alvos são relativamente pontuais, focando, sempre que possível, nos objetivos do Hezbollah, na tentativa de minimizar os danos ao Estado do Líbano e evitar o desencadeamento de uma guerra regional mais ampla. Mesmo o bombardeio da Força Aérea realizado em 25 de agosto, que visava impedir um ataque do Hezbollah a alvos estratégicos no coração de Israel, foi pontual, embora extremamente importante.
A política israelense – é preciso dizer – é motivo de grande debate entre os especialistas em segurança e os tomadores de decisão, que não querem escalar a situação, mas também não resolvem o problema. Quem fica frustrado e muito irritado são os moradores da região, que observam com preocupação como o fim deste ciclo de conflito parece distante, assim como a possibilidade de retomarem a vida normal que perderam. Eles também estão indignados com o fato de que Israel só ataca quando a área central de Israel está em risco, o que gera uma sensação de que eles são menos importantes.
Enquanto as guerras lidam com questões macro, como estratégia, tática, avaliação de chances e riscos, relações internacionais e sistemas de armas complexos, entre outras, a vida real é o que verdadeiramente importa, o que toca o cidadão comum e o seu bem-estar diário. Os evacuados e os demais moradores do norte que permaneceram em suas casas, vivendo em uma realidade impossível de bombardeios incessantes, olham ao redor à procura de um horizonte, uma liderança que lhes diga para onde tudo isso está indo e quando terminará. Até agora, apesar do ataque preventivo da Força Aérea, eles não recebem nenhuma resposta.
Esse texto não reflete necessariamente a opinião do Instituto Brasil-Israel.
(Foto: Reprodução/Flickr Israel Defense Forces)