Revital Poleg
À luz da atual tensão crescente, centrada no Oriente Médio devido à ameaça iraniana de atacar Israel (além da ameaça do Hezbollah, proxy do Irã, de fazer o mesmo), uma ameaça que pode explodir a qualquer momento e ter impacto global, torna-se relevante analisar os laços cada vez mais estreitos entre o Irã e vários países da América Latina, incluindo o Brasil. Embora seja um direito soberano de cada nação estabelecer relações com os países que desejar, é importante lembrar que qualquer relacionamento com o Irã traz consigo o que podemos chamar de ‘dote duvidoso’ – um país amplamente visto pelas nações ocidentais e moderadas do Oriente Médio como o líder do ‘eixo do mal’, financiador e incentivador do terrorismo internacional.
Nos últimos anos, e especialmente desde o início da “onda rosa” pelo continente (o fenômeno político do início do século 21 caracterizado pela ascensão de lideranças esquerdistas ao poder na América Latina), o Irã aumentou significativamente suas atividades nas Américas Central e do Sul, com um número crescente de países optando por estreitar seus laços com Teerã. Esta estratégia está alinhada com a visão ampla do Irã, que busca identificar e unir forças contra a influência ocidental — e mais especificamente contra os EUA, considerados os líderes dessa influência — sempre que possível, além de minar os esforços de Israel para expandir sua influência política e de segurança na região do Oriente Médio.
Vale destacar que nos dois atentados realizados em Buenos Aires pelo Hezbollah, com financiamento e apoio iraniano, e que foram direcionados contra alvos judeus e israelenses em solo argentino – o atentado contra a Embaixada de Israel (1991) e o atentado contra a AMIA (1994) – também houve mortes e feridos entre cidadãos argentinos que simplesmente estavam no local. O terrorismo, como se sabe, não conhece fronteiras, e o apetite assassino do Irã, ao que parece, não tem piedade e não distingue entre sangue e sangue. Será que essa crescente aproximação com o Irã, poderia eventualmente colocar em risco a própria América Latina? Algo para se refletir.
Neste contexto, não é por acaso que, recentemente, na véspera do 30º aniversário do atentado à AMIA, a Argentina declarou o Hamas como uma organização terrorista e congelou seus ativos financeiros. Além disso, o país está empenhado em buscar a extradição do ministro do Interior iraniano Ahmad Vahidi, apontado como responsável pelo ataque, segundo o sistema judicial argentino.
Como parte da política iraniana declarada de “revolução contínua” ou “exportação da revolução”, o Irã envia forças combatentes e financiamento além de suas fronteiras. Nesse contexto, o país está profundamente envolvido com o terrorismo islâmico e palestino, além de ser uma espécie de líder dessas ações. O Irã financia, treina e orienta um grande número de organizações terroristas alinhadas com ele, incluindo o Hamas, o Hezbollah, a Jihad Islâmica Palestina, as milícias xiitas no Iraque, os Houthis no Iêmen e o regime sírio de Bashar al-Assad, que serve como canal de fornecimento para os proxies do Irã e, em troca, recebe assistência para o desenvolvimento de armas avançadas.
Segundo Danny (Dennis) Citrinowicz, pesquisador associado do Programa Irã no Instituto de Estudos de Segurança Nacional, na visão ampla do Irã, o país está disposto a trabalhar com qualquer um que queira conter ou restringir a influência ocidental, onde quer que seja. É por isso que o Irã, um estado teocrático onde o Islã xiita é o valor supremo, está disposto a colaborar com regimes seculares e até mesmo marxistas, que nada têm a ver com religião. Além disso, na visão iraniana, as lutas dos países da América Latina pela libertação do “opressor estrangeiro” ocidental são muito semelhantes à sua própria luta contra o Ocidente, tornando esses países “estados de mentalidade semelhante”, com muito em comum.
Na prática, o Irã concentra seus esforços políticos e de segurança em vários países que considera chave no continente, com destaque para a Venezuela, que, na visão iraniana, é considerada o centro de operações de suas atividades na região. As relações entre os dois países incluem, além de uma colaboração diplomática conjunta, uma extensa parceria de segurança, que se baseia em uma assistência militar significativa, como o fornecimento de drones e embarcações militares que o Irã disponibiliza à Venezuela.
A Bolívia também é vista como um “país em ascensão”, no que diz respeito à influência iraniana. O acordo de segurança assinado entre os dois países em julho de 2023, que inclui, entre outras coisas, a venda de drones e embarcações fluviais ao regime boliviano, bem como a cooperação na área de cibersegurança e treinamentos militares conjuntos, demonstra a profundidade da cooperação em desenvolvimento entre Teerã e La Paz, que o atual governo boliviano busca expandir. Além disso, o Irã continua a aprofundar seus laços com a Nicarágua e a Colômbia, onde procura aproveitar o governo do presidente Gustavo Petro, que é um opositor vocal e determinado contra a influência ocidental em seu país. O Irã também continua a expandir sua cooperação com Cuba, especialmente nas áreas econômica e tecnológica.
Mas, acima de tudo, o Irã está interessado em fortalecer significativamente suas relações com o Brasil, que considera o país mais importante do continente em termos políticos e econômicos. Na visão do regime em Teerã, a adesão do Brasil aos BRICS sob a liderança do presidente Lula cria uma oportunidade única para aprofundar sua influência nesse país importante, além de ampliar sua presença na grande comunidade de muçulmanos xiitas que reside no Brasil.
Além dos benefícios econômicos e políticos decorrentes do fortalecimento desses laços no continente, é importante destacar as tentativas de terrorismo iraniano descobertas no último ano no Peru e no Brasil, bem como o uso extensivo de passaportes bolivianos pelo Irã.
Isso indica que Teerã (seja diretamente ou por meio de seus grupos proxy presentes no continente) busca aproveitar sua presença na América Latina para promover atividades terroristas, explorando os laços amistosos com esses países — uma manobra que, sem dúvida, é realizada sem o conhecimento ou consentimento deles, algo que pode acabar se voltando contra esses próprios países como um triste bumerangue.
Esse texto não reflete necessariamente a opinião do Instituto Brasil-Israel.
(Foto: Reprodução/Flickr Presidência da República)