Revital Poleg
“Toda noite, quando vou para casa”, me conta o Embaixador Danny Shek, ex-Diplomata de Israel, que dirige o departamento internacional da sede das famílias dos sequestrados, “rezo para amanhã não precisar mais voltar aqui. Rezo para que isso tudo acabe”. Mas, por enquanto, já se passaram três meses e os sequestrados ainda estão em Gaza. No momento em que escrevo, a libertação deles não está à vista, e a hora está correndo. Cada minuto que passa põe em risco a vida deles ainda mais.
A sede das famílias dos reféns é uma emocionante e inspiradora iniciativa voluntária da sociedade civil israelense. No coração de Tel Aviv, em um prédio modesto e nada novo, em três de seus oito andares, acontece uma tremenda atividade. Quem entra ali não pode deixar de ficar impressionado com a sensação de ação constante que prevalece neste lugar e, acima de tudo, com o incrível sentido de missão e a profunda crença na importância dela, que certamente é uma das mais significativas já ocorridas em Israel.
Menos de 24 horas após o ataque do Hamas, enquanto estávamos tentando digerir a palavra “sequestrado”, o significado e o alcance horroroso – que ainda nem sabíamos no momento (porém, ficou claro tratar-se de grande número de pessoas) -, centenas de israelenses se mobilizaram de forma espontânea para apoiar e acompanhar as famílias dos sequestrados e ajudar em uma tarefa que jamais havíamos enfrentado. Ninguém nos treinou ou nos ensinou a conduzir tal situação.
Os desafios são enormes: como ajudar as famílias cujos entes queridos são sequestrados por uma organização terrorista monstruosa e cruel, organização desprovida de qualquer senso de humanidade que mantém os sequestrados em condições extremamente difíceis, submetidos a terror físico e psicológico e sem qualquer atendimento médico, por mais de três meses? Como manter a consciência internacional diante de uma organização fundamentalista que rapta bebês, idosos, mulheres e homens de suas casas ou de festas das quais participaram, apenas por serem israelenses? E como conseguir que o mundo se mobilize para uma missão humanitária primordial e continue a fazê-lo por tanto período de tempo?
Mas, o coração palpitante e os valores sobre os quais crescemos são a bússola moral segundo os quais a sede das famílias opera. Todos os que vieram para agir e ajudar na sede continuam lá até hoje. Ele opera sete dias por semana, da manhã até a noite, e assim continuará enquanto for necessário.
Tudo, mas absolutamente tudo, aqui é feito de forma totalmente voluntária, profissional e organizada, com qualidade e escopo impressionantes. Todos os esforços são focados exclusivamente na assistência holística às famílias dos sequestrados, incluindo suporte mental e social, assistência diversificada de logística, organização de atividades de advocacia tanto em Israel quanto no exterior e promoção de esforços contínuos por meio de canais locais, regionais e internacionais para que os sequestrados voltem para casa. São milhares de voluntários, familiares, amigos dos sequestrados e alguns dos que já foram libertados e estão em condições de fazê-lo, além de especialistas seniores nas áreas de segurança, jurídica, médica, comunicação e diplomacia que dedicam seu tempo à causa.
A atividade é financiada apenas por doações. Não há um centavo do dinheiro governamental aqui. A agenda dos voluntários é uma só: em prol das famílias! Pelo retorno de todos os sequestrados para suas famílias com segurança, e já! Não há nenhuma agenda política aqui, este é um ato que vem do coração e entra no coração, e está focado em ajudar aqueles cujo mundo foi devastado. Essa ação não substitui a do governo, cujo papel e obrigação é empenhar-se pela libertação de todos os sequestrados e devolvê-los ao lar urgentemente.
A convite de meus antigos colegas, altos funcionários aposentados do Ministério das Relações Exteriores, que lideram a atividade internacional na sede das famílias, participei da reunião realizada lá com o embaixador brasileiro em Israel, Sua Excelência Frederico Meyer, no dia 1º de janeiro de 2024.
Na reunião, o embaixador foi informado sobre as atividades da sede e os tipos de assistência que presta às famílias dos sequestrados, os princípios segundo os quais a atividade é conduzida e, mais especificamente, a operação internacional e as ações realizadas, tais como as missões das famílias a diversos países e as reuniões com autoridades, como foi o caso da delegação que visitou o Brasil há algumas semanas.
Como era de se esperar, a conversa também tratou de Michel Nisenbaum, de 59 anos, nascido no Brasil e com cidadania brasileira. Michel foi sequestrado pelo Hamas na manhã de 7 de outubro, enquanto dirigia de sua casa de Sderot para levar sua netinha de volta para casa. Depois que foi esclarecido que ele está no cativeiro do Hamas, nenhuma outra informação foi recebida sobre ele. Foi manifestada a esperança de que o Brasil possa contribuir para sua libertação.
O maior destaque da reunião foi quando a Moran Stela Yanai, libertada do cativeiro após 54 dias, se juntou à conversa, apoiada por muletas e com bandagens ao longo de sua perna direita. Moran, desenhista de jóias com 40 anos de idade, que veio à festa da NOVA para vender suas joias, acabou sendo sequestrada em Gaza, machucada e com dores.
“Desde o momento em que fui sequestrada, eles me tiraram tudo: o controle sobre a minha vida, a minha liberdade, meu nome, minha identidade.” Ela acrescentou: “O pensamento que mais me assustava lá em Gaza era o de ser esquecida, de que as pessoas em Israel se acostumariam ao fato de estarmos lá e desistiriam de nós”. Ela enfatiza que “nunca devemos esquecer que em Gaza há mais 129 mulheres e homens, crianças pequenas e idosos, árabes e judeus. Eles não têm tempo! A cada dia que passa, eles estão em maior perigo de vida”.
Ela passou a maior parte de seu cativeiro em quartos isolados e escuros nas casas de membros do Hamas, para onde era transferida a cada poucos dias. De maneira impressionante e respeitosa, ela contou ao embaixador sobre a humilhação que sofreu no cativeiro, sobre a fome intensa e a necessidade de implorar por comida, sobre o fato de que lhe foi negada água e qualquer tratamento médico, durante os dias em que sofreu com uma violenta bactéria no estômago. Ela contou sobre os dias em que a puniram e lhe negaram comida (enquanto seus guardas, terroristas do Hamas, comiam ao lado dela), sobre a completa falta de higiene. E isso é apenas o pouco do que ela compartilha com a gente.
“Desde minha libertação”, enfatiza Moran mais uma vez, “já se passaram quase 40 dias, durante os quais 129 sequestrados ainda estão lá. Todos que estão lá correm risco de vida. Um perigo verdadeiro e tangível. Estou muito preocupada com eles, com as moças, com os idosos e com todos os outros, cuja situação só está piorando. É difícil entender o que eles estão passando. Eles precisam ser libertados, e imediatamente”.
E todos nós aqui esperamos e oramos para que sejam de fato libertados agora!
Foto: Moran Stela Yanai/Hostages’ Families Headquarters