Por João Torquato
Uma vez por ano, a branquitude brasileira tentar ser um pouco menos racista e fingem se importar com o povo negro. Quando o mês acaba, a vida “volta ao normal”, as pessoas voltam a segurar suas bolsas quando avistam um negro na rua, e artistas brancos continuarão perguntando se um negro usufruindo de um hotel é funcionário do local, afinal de contas, para a branquitde, só estamos ali para servir.
A luta antirracista no Brasil, historicamente, tem uma ligação com os setores progressistas e da esquerda brasileira, já que muitas organizações fundamentais para a luta antirracista em nosso país, desempenharam um papel de vanguarda na construção de partidos políticos e sindicatos. Porém, devido a essa ligação, a esquerda brasileira ganhou um status de “isenção” de praticar racismo, mesmo essa tendo, em boa parte dos seus espaços, lideranças e direções em sua maioria composta por pessoas brancas. É importante lembrar também que muitas dessas organizações, se posicionaram contra políticas públicas de favorecimento ao povo negro, como o REUNI (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) e as cotas.
Desde o dia 7 de outubro, quando o grupo terrorista Hamas, entrou em Israel e matou mais de 1400 pessoas, incluindo crianças e idosos, o antissemitismo aumentou de uma maneira alarmante no Brasil, com um aumento de 900%, segundo os dados da CONIB (Confederação Israelita do Brasil).
Dentro desses ataques ao povo judeu, uma parte das lideranças pró-palestinas no Brasil gritam aos quantos cantos que Israel é um Estado de apartheid, fazendo referência a política de segregação praticada pelos brancos na África do Sul. Essas mesmas pessoas que em qualquer lugar do mundo, jamais saberão o que é a dor do povo negro, o que é você não poder sair de casa sem saber ser vai voltar e gozam do status que a branquitude proporciona aqui no Brasil. Essa apropriação do termo apartheid dentro da causa palestina, não apenas uma assalto a dor do povo negro, mas é um elemento de descaracterização de um fenômeno complexo, dentro de outra realidade. O que essas pessoas fazem, é a instrumentalização da dor dos mais de 300 anos de escravidão para satisfazer o próprio ego.
Quando eu me refiro a Israel, estou falando das fronteiras reconhecidas pela comunidade internacional, inclusive pelo Brasil, antes de 1967, e dentro desse Estado, existe uma comunidade negra e judia, que de uma hora pra outra, passou a ser colocada como branca e colonizadora, por pessoas brancas, que volto a repetir, gozam dos privilégios da branquitude. Por que ninguém diz que os terroristas do Hamas falaram que as mulheres de peles mais escuras seriam decapitadas? Por que ninguém fala dos 12 judeus negros, que foram brutalmente assassinado pelo Hamas, das mesma forma que a polícia faz com o povo negro aqui no Brasil?
Eu mesmo já tive minha judeidade negada por algumas pessoas brancas, já ouvi que “essa história de ser negro e judeu não existe”. Em em suas cabeças é impossível conceber um judeu negro, tanto pela leitura de Isral e do povo judeu como um povo branco, quanto pela visão esteriotipada sobre a religão “certa” dos negros. Quando eles me negam a judeidade, não me negam apenas o direito de ser judeu, eles negam também o meu direito de ser negro. A partir daí, eu me transformo em um colonizador, assassino, mesmo já tendo a polícia entrando na minha casa sem autorização, e sendo vítima constante de violência policial. Se não bastasse tudo isso, uma mesa, realizada na Universidade de São Paulo, teve 7 pessoas brancas, para gritar que um país é racista e pratica apartheid, em pleno mês da Consciência Negra.
O fetiche pelos judeus de Auschwitz e o fetiche pelo massacre de Soweto, vem do mesmo lugar, no fim, eles gostam dos que morreram, dos que sofrem. Os que lutam dentro da sociedade israelense por mais diversidade, contra a extrema-direta e por mais igualdade, para eles não importam.
Foto: Yehudit Garinkol/WikimediaCommons