Revital Poleg
Como todos os anos, neste 15 de maio, a data que corresponde com a data original hebraica da declaração de independência de Israel, o povo palestino comemorará o “Dia da Nakba” – (النكبة) que significa em árabe: “O Dia do Desastre”. Embora a data sempre fique carregada tanto emocionalmente quanto em termos de segurança, este ano está muito mais carregada ainda em todos os parâmetros.
O que mudou desta vez?
Pela primeira vez, Israel é governado por uma coalizão de extrema direita – mais do que jamais conhecemos. Alguns de seus membros não hesitam em falar duramente contra os palestinos, aumentando as tensões já existentes.
No momento em que escrevo este artigo, e já por vários dias, a operação militar “Escudo e Flecha” está ocorrendo entre Israel e o grupo terrorista Jihad Islâmico, baseado na Faixa de Gaza e financiado pelo Irã. O aniversário da Nakba pode servir de incentivo para eles (e para mais entidades Palestinas) intensificarem os ataques.
As celebrações anuais do “Dia de Jerusalém”, que marcam a unificação da cidade, vão começar no início desta semana, culminando em 18 de maio – com o tradicional “Desfile das Bandeiras” – um evento que sempre é sensível do ponto de vista da segurança (e que já foi um dos motivos da escalada de violência entre Israel e Gaza de 2021).
E, pela primeira vez, o Dia da Nakba será comemorado na ONU, de acordo com a decisão da Assembleia Geral, tomada ao final de novembro de 2022. Mahmoud Abbas, Presidente da Autoridade Palestina, apresentará o discurso principal.
A Nakba marca a fuga ou expulsão de aproximadamente 700.000 palestinos (de acordo com dados da UNRRA) durante a Guerra de Independência de Israel (1948) e a transformação dos palestinos em refugiados. A maioria dos refugiados foi para países árabes e islâmicos ou para a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, que ficaram, ao final da guerra, nas mãos da Jordânia e do Egito. Alguns deles se mudaram para outros povoados em Israel. Esse momento marca também a origem do problema dos refugiados palestinos e a demanda do “direito de retorno”.
Em 29 de novembro de 1947, a Assembleia Geral das Nações Unidas propôs a partilha do Mandato Britânico da Palestina em dois estados – um judeu e outro árabe. A comunidade judaica aceitou o Plano de Partição da Palestina, enquanto a comunidade árabe palestina, apoiada pela Liga Árabe, rejeitou o plano, declarando que oporia resistência armada à sua implementação.
Em 14 de maio de 1948, o último dia do mandato britânico, a liderança judaica anunciou o estabelecimento de um Estado judeu em Israel, de acordo com a resolução da ONU. No dia seguinte, os exércitos de sete países árabes invadiram a Terra mandatória de Israel, dando início à segunda fase da Guerra de Independência de Israel.
O termo “Nakba” foi cunhado pela primeira vez pelo orientalista sírio Constantin K. Zurayk, que escreveu seu livro “The Meaning of the Disaster” (O significado do desastre) durante a Guerra da Independência, referindo-se ao erro cometido, em sua opinião, pelos sete exércitos árabes que concordaram com a primeira trégua, o que, segundo ele, possibilitou o desastre.
Embora o ponto de partida da Nakba remonte a maio de 1948, a comemoração do Dia da Nakba de forma oficial e institucional na sociedade árabe em Israel é um fenômeno relativamente novo. No início dos anos 90, foi criada a “Association for Defence of the Rights of the Internally displaced Persons in Israel” (Associação de Defesa dos Direitos das Pessoas Deslocadas Internamente em Israel), com o objetivo, como o próprio nome diz, de proteger os direitos dos cidadãos árabes que foram forçados a deixar suas casas em 1948.
Em 1998, no cinquentenário da independência de Israel, e como parte da tentativa de aumentar a consciência pública sobre a questão, o comitê decidiu, pela primeira vez em Israel, comemorar o Dia da Nakba com uma marcha simbólica para uma das aldeias abandonadas e encerrá-la com uma cerimônia.
Desde 1998, o Dia da Nakba é comemorado em Israel na data hebraica do Dia da Independência de Israel, em procissões e comícios organizados pela Associação sob o slogan criado pelo jornalista árabe-israelense Lutfi Mashur: “O Dia da Independência deles é o nosso Dia da Nakba”.
Nos anos em que a data hebraica do Dia da Independência não corresponde ao calendário gregoriano, o Dia da Nakba muda com ele (como foi o caso deste ano, em 26/04). Ou seja, o calendário hebraico determina quando o Dia da Nakba será comemorado em Israel.
Na Autoridade Palestina e na diáspora palestina, por outro lado, é costume comemorar o Dia da Nakba em 15 de maio, e a data hebraica é completamente ignorada.
Além disso, o público árabe em Israel não comemora oficialmente nem institucionalmente o dia 15 de maio, exceto entre dois grupos – a facção do norte do movimento islâmico e os “aldeões” – que se diferenciam da sociedade israelense, entre outras coisas, por boicotarem as eleições do Knesset. Portanto, não seria irracional afirmar que, ao longo dos anos, surgiram dois dias comemorativos: O “Dia da Nakba em Israel” e o “Dia da Nakba Palestina”.
Em janeiro deste ano, o membro do Knesset Walid Khalil Al-Hawashleh, do partido Ra’am, apresentou um projeto de lei “para estabelecer por lei o dia 15 de maio como o Dia da Lembrança da Nakba”. O procedimento proposto para o Dia em Memória da Nakba é baseado nos princípios do Dia em Memória dos Soldados Caídos de Israel. O objetivo da lei – de acordo com o explicado – é promover o reconhecimento do sofrimento e a dor do outro, mesmo quando se trata de uma minoria nacional. A proposta é idêntica ao projeto de lei apresentado pelo MK Ahmed Tibi, de Ta’al, no Knesset anterior (que não foi aceito).
Esse é, de fato, um projeto de lei declaratório, pois está claro para todos os lados que não tem chance de ser aprovado, devido à composição do Knesset, e não apenas devido à composição atual.
Seja a data preferida a hebraica ou seu equivalente gregoriano, trata-se de uma data que abarca duas narrativas divididas e divergentes, que não podem ser separadas uma da outra. Infelizmente, ainda é muito difícil ver a possibilidade de estabelecer pontes entre elas reconhecendo suas diferenças e respeitar os sentimentos de cada lado, mesmo se não concordar com eles.