Hoje, 20 de dezembro, estreou a minissérie da Globo, “Passaporte para Liberdade”, que conta em oito capítulos, a história de Aracy de Carvalho (1908-2011), funcionária da Embaixada brasileira em Hamburgo, durante a 2ª Guerra Mundial.
O enredo da série suscitou debates entre historiadores sobre a possível mitologização do heroísmo ou não de Aracy de Carvalho e da verossimilhança com a realidade dos fatos. Afinal, a história de Aracy é verdadeira ou é romantizada?
A novela foi criada e escrita por Mario Teixeira, com colaboração da inglesa Rachel Anthony, e com a direção de Jayme Monjardim. Teixeira e Monjardim usaram informações do museu Yad Vashem, o Museu do Holocausto, em Jerusalém, para reconstituir a história de Aracy. De acordo com o museu, Aracy de Carvalho emitiu vistos para que judeus imigrassem ao Brasil, entre 1938 e 1939.
De acordo com a instituição, Aracy se arriscou contornando regras de imigração, permitindo que famílias judias fugissem das atrocidades da guerra. Em 1982 Aracy recebeu o título de “Justa entre as Nações”, homenagem concedida a não judeus que auxiliaram e salvaram, desinteressadamente e eventualmente se expondo a riscos, judeus perseguidos pelo nazismo.
O museu levou em consideração relatos de quatro pessoas que declararam ter obtido vistos para deixar a Alemanha no consulado do Brasil em Hamburgo.
Alguns historiadores questionam o heroísmo expresso na história. Em um estudo recém-publicado (“Judeus no Brasil: História e Historiografia”, Garamond, 480 págs., R$ 80), Fábio Koifman e Rui Afonso afirmam que não houve nenhum gesto de heroísmo por parte dos funcionários do Consulado do Brasil na cidade de onde Aracy era funcionária.
Os historiadores se debruçaram sobre os arquivos do Ministério das Relações Exteriores e concluíram “que nenhum visto irregular ou qualquer ilegalidade foi praticada pelo serviço consular da representação brasileira em Hamburgo no período em que a ajuda humanitária a perseguidos judeus é atribuída”.
O roteirista da minissérie, Mário Teixeira, se disse surpreso com o questionamento dos historiadores: “Essa teoria é desmentida pelo Museu do Holocausto (Yad Vashem), que levanta uma documentação absolutamente profunda para conceder a honraria “Justo Entre as Nações” a uma pessoa. Essas questões são muito discutíveis, porque o próprio trabalho da Aracy foi além do que fazia um funcionário [do consulado]”.
Já o diretor, Jayme Monjardim, classificou como uma “piada” o questionamento daqueles que desacreditam a veracidade dos fatos da novela pela ausência de documentos: “É lógico que não existem registros no consulado, porque ela [Aracy] fazia isso de uma forma ilícita, escondida. Então não tem como existir provas a respeito disso”.
O Yad Vashem afirma ainda que Aracy, além de emitir os vistos para que os judeus fugissem, ajudou com todos os preparativos para uma partida segura da Alemanha, o que incluía apoio financeiro e provisões para levar a bordo do navio, como móveis. E que durante o pogrom da Kristallnacht, de 9 a 10 de novembro de 1938, Aracy de Carvalho também teria abrigado em sua casa Margarethe Bertel-Levy e seu marido.