A desunião pode fazer a força de Netanyahu nestas eleições

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Foto: Daniela Kresch

TEL AVIV – Não tenho bola de cristal, mas se quiserem um aposta, aí vai: o partido de direita Likud, do primeiro-ministro Benjamin “Bíbi” Netanyahu, vai receber a maior quantidade de votos nas eleições da terça-feira (23 de março), a 4ª em apenas dois anos. Até aí, não acho que eu seja uma vidente. A pergunta é: quantas cadeiras Netanyahu vai receber no universo de 120 do Knesset, o Parlamento em Jerusalém, e quão difícil será, para ele, montar uma coalizão de governo estável e duradoura de 61 assentos?

Quem aceitará unir forças com Netanyahu e quem preferirá o bloco anti-Bíbi? Será que alguém que critica o premiê hoje vai dar o braço a torcer e se curvar a ele? Veremos um novo Benny Gantz, o atual primeiro-ministro alternativo e ministro da Defesa do partido “Azul e Branco” que perdeu a relevância e o respeito de muita gente ao aceitar formar uma coalizão com o Likud, no ano passado, sendo depois humilhado pela habilidade política de Netanyahu?

Minha inexistente bola de cristal é incapaz de prever isso. Mas a impressão que eu tenho é que as oposições não aprendem, nos dois lados do Atlântico. Tanto em Israel quanto no Brasil, lideranças que se opõem ao governo atual não conseguem se unir para um objetivo em comum: substituir o atual líder. 

No Brasil, as discussões sobre uma frente ampla contra o atual presidente Jair Bolsonaro, nas eleições de 2022, parecem esbarrar em egos. O mesmo acontece em Israel, onde partidos de oposição a Netanyahu não conseguiram se unir para substituir “Bíbi”.

Não falo apenas de lideranças voltadas para a esquerda. Incluo aí centristas e até mesmo direitistas. Todos dizem que o primordial é levar a uma mudança no Knesset após 12 anos consecutivos de governo Netanyahu. Acusam Bíbi de semear um culto à sua personalidade no estilo Donald Trump, de só se importar com seu futuro político e buscar, acima de tudo, algum tipo de imunidade ou indulto diante das três acusações por corrupção que enfrenta na Justiça. 

Mas, quando chega a hora de unir forças, cada um vai para um lado. Só não entendem que canibalizam uns aos outros, enfraquecem sua causa e pior: perigam nem mesmo entrar para o Knesset. E é justamente isso que pode fortalecer Netanyahu e levá-lo a uma nova coalizão viável (mesmo que não muito estável ou duradoura) também desta vez. Mesmo que  Netanyahu convoque uma 5ª eleição seis meses depois. Assim, ele vai empurrando com a barriga seu anoitecer político ao mesmo tempo em que tenta, de toda forma, não ir para a prisão. 

Para entender isso é preciso conhecer o xadrez maluco que é o sistema eleitoral israelense. Para eleger parlamentares para o Knesset, um partido ou legenda precisa de 3,25% do total dos votos dos eleitores. Isso se traduz, atualmente, a uns 140 mil votos ou 3 ou 4 cadeiras. Nenhuma bancada terá menos que 3 assentos. E os partidos que não conseguem chegar a esse número de 3 ou 4 (dependendo do número de votos), simplesmente estarão jogando no lixo os votos depositados para eles.  

Digamos que o tradicional partido esquerdistas Meretz consiga só 3,2% dos votos totais. E o centrista Azul e Branco, de Gantz, também consiga apenas 3,2%. Simplesmente vão sumir do mapa parlamentar porque não chegaram a 3,25%, cada um. Vão jogar fora pouco menos de 280 mil votos da esquerda e da centro-esquerda. Se tivessem se unido – quem sabe em um bloco junto com o Partido Trabalhista – poderiam formar uma grande bancada, levando em consideração que os trabalhistas devem receber, segundo as pesquisas, umas 6 cadeiras. Unidos, eles poderiam somar, quem sabe, até umas 10 cadeiras.

Esse bloco poderia se unir ao partido “Há Futuro”, com 18 cadeiras previstas, e, quem, sabe, até mesmo ultrapassar o Likud em número de votos. Poderiam receber primeiro a chance de formar um governo. Era só se unir. Quem sabe, o direitista Guideon Saar, do recém-lançado partido “Nova Esperança”, com previsão de 10 cadeiras, pudesse se unir a esse bloco. Ok, Saar não é uma pessoa de esquerda, longe disso. É contra a criação de um Estado palestino, por exemplo. Mas todos esses citados acima querem primordialmente substituir Netanyahu, tirá-lo do trono que ocupa há tantos anos.

Deu para entender? Essa questão do nível mínimo para elegibilidade é importantíssima quando você tem um monte de partidos concorrendo separados. E é isso que o Netanyahu quer: que todos briguem, se mantenham separados, formem bancadas pequenas ou nem mesmo consigam se eleger.

É o que vai acontecer com a “Lista Conjunta”, da minoria árabe-israelense (21% da população). Nas últimas eleições, a lista era formada por 4 partidos diferentes e que nem sempre se entendem. Têm ideologias distintas em termos políticos e socioeconômicos. Mas, desde 2015, se unem para formar uma legenda única. O resultado é que os árabes têm, atualmente, 15 cadeiras no Knesset: a terceira maior bancada. Com isso, conseguiram mais representatividade e que mais árabes votassem.

Mas, para as eleições de 23 de março, eles se separam em dois blocos: a “Lista Conjunta”, com 3 partidos, e o partido islâmico Ra’am separado depois que foi cortejado por Netanyahu. Seu objetivo é claro: enfraquecer a “Lista Conjunta”. E, separando o Ra’am, pode até ser que ele nem consiga dos 3,25% necessários, o que significaria menos parlamentares árabes no Knesset.

Nas eleições deste mês de março, a melhor campanha eleitoral de Netanyahu é a desunião de seus opositores. Mesmo sem bola de cristal, aposto que sua habilidade política o levará para mais uma vitória. A pergunta é quanto tempo ele continuará a empurrar com a barriga sua permanência no poder entre pleitos e coalizões fracas e instáveis.

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