O “gambito” de Saar: quem é o “rebelde” do Likud que ameaça Netanyahu?

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Guideon Saar quando ainda era Ministro da Educação (Foto de Avi Ohayon/GPO)

TEL AVIV – Reservem essa data: 16 de março de 2021. Será provavelmente nesse dia que acontecerá a próxima eleição geral em Israel: a quarta em apenas dois anos. Enquanto as pessoas pensam na vacina e nutrem esperança de que o fim da pandemia de Covid-19 esteja à vista, a política israelense só esquenta. A aposta geral é a de que estamos prestes a ver a dissolução deste governo – que existe há apenas sete meses – e a convocação de um novo pleito. Tanto que a comissão interna do Parlamento que lida com eleições já marcou a data acima. Só falta mesmo dissolver o Knesset.

Surfando nesse clima, acaba de acontecer a primeira grande jogada política pré-eleições: Guideon Saar, um dos parlamentares mais identificados com o partido conservador Likud, deixou de surpresa o partido nesta terça-feira, 8 de dezembro. Ele é considerado um “Likudnik-raiz” da nostálgica época em que o Likud era um partido mais perto do centro do que da extrema direita. Da época em que o Likud tinha nomes como Dan Meridor e Benny Beguin e dava origem a políticos como Tzipi Livni e Ehud Olmert.

Guideon (com “u” depois do “G” para que ninguém diga “Jideon”) Saar (ou Sa’ar, como alguns escrevem) tem 54 anos. Ele foi membro do Knesset (o Parlamento, em Jerusalém) por mais de uma década. Foi ministro da Educação e do Interior. Ele anunciou a criação de uma nova legenda e prometeu que irá aglutinar nomes da centro-direita para tentar tirar o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu – seu desafeto – do poder. 

Afinal, a centro-esquerda do partido Azul e Branco, liderado por Benny Gantz, não conseguiu derrubar Netanyahu, a 11 anos consecutivos no poder e prestes a ser julgado por três crimes de corrupção. Gantz se deixou levar pela esperteza política de Netanyahu, que prometeu a ele mundos e fundos – incluindo um governo de “rotação” no qual Gantz se tornaria primeiro-ministro daqui a um ano. 

Só rindo. Hoje, todo mundo sabe que Netanyahu nunca pretendeu “largar o osso”. Ele enfraqueceu e jogou Gantz para escanteio assim que o governo foi formado, para desânimo de quem votou no Azul e Branco, incluindo esquerdistas esperançosos que abandonaram o Partido Trabalhista e o Meretz. 

Então, o que significa a saída de Saar para a política israelense? Será que ele será o nome que finalmente conseguirá tirar Netanyahu do poder? 

Para o Dr. Emmanuel Navon, um veterano membro do Likud, professor de Relações Internacionais na Universidade de Tel Aviv e pesquisador do Kohelet Policy Forum, a candidatura de Saar para o governo é uma jogada importante no xadrez da política israelense. Segundo ele, o Likud deixou de ser um “partido político”, nos últimos anos para se tornar um grupo cujo objetivo é promover e proteger uma só pessoa: Benjamin Netanyahu.

“É um partido pessoal no qual, para subir dentro dele, é preciso puxar o saco de Netanyahu. É um sistema que elimina talentos e promove a ambição pessoal em relação ao primeiro-ministro”, diz Navon.

Guideon Saar surgiria aí como um “rebelde” que deixa o ninho para concorrer contra o ex-chefe. Seu objetivo é se tornar um líder da direita moderada e da centro-direita, que há tempos não tem um nome que as representa. Há quem o compare a uma espécie de “Joe Biden” israelense: alguém de centro que pode tirar o extremista de direita do trono. 

Nas primárias do Likud em 2019, Saar tentou peitar Netanyahu e se tornar líder do Likud. Não conseguiu, mas nada menos de 25% dos eleitores nas primárias votaram nele. Quer dizer: tem muita gente no Likud que adoraria ver Netanyahu fora da liderança do partido. 

“Há uma grande quantidade de pessoas que são politicamente conservadoras e continuam a votar no Likud apesar do Netanyahu, apesar do fato de estarem completamente fartos dele”, diz Emmanuel Navon. “Elas não querem votar no Naftali Bennett (líder do partido de extrema-direita “Yemina”), porque ele está muito à direita e não se identificam com ele. Acho que o partido Gideon Saar forneceria uma alternativa”. 

Segundo Navon, a visão da direita moderada israelense, hoje em dia, é a de que Netanyahu “está causando mais danos do que benefícios ao país”.

“Acho que é hora de as pessoas se organizarem e perceberem que temos que agradecer a Netanyahu pelo que ele fez, mas percebam que é hora de colocar o país em primeiro lugar e impedir que Netanyahu mantenha o país como refém para sua sobrevivência pessoal e política e eleger um novo líder responsável e sério que tenha experiência e seja capaz de administrar esta crise política, a pandemia e suas dramáticas consequências econômicas. Eu acredito que Gideon Saar tem a habilidade, a experiência e o profissionalismo para fazer isso”, diz Navon.

Em Israel, alguns dizem que só a direita consegue fazer acordos de paz. Nem é verdade, porque foi o Partido Trabalhista de Rabin e Peres que negociou os Acordos de Oslo e a paz com a Jordânia, mas o lugar comum aqui é que é a direita que acaba fazendo as concessões maiores: acordo de paz com o Egito, retirada da Faixa de Gaza, etc. Quem sabe caberá a um membro do próprio Likud fazer o que a esquerda israelense tanto almeja: tirar Netanyahu do poder? 

A pergunta maior é: que líder seria Saar? O quão “moderado” ele realmente é? Do ponto de vista do lado mais à esquerda da política israelense, seria trocar alhos por bugalhos? No xadrez da política israelense, esse “gambito” de Saar ainda precisa ser analisado e avaliado por enxadristas mestres.

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