TEL AVIV – O presidente-eleito americano Joe Biden, que tomará posse em 20 de janeiro de 2021, já anunciou quem será o futuro secretário de Estado americano, que substituirá Mike Pompeo (abertamente pró-Israel). Trata-se de Antony Blinken, um judeu de 58 anos. Mas quem é Blinken? Será um diplomata anti-Pompeo e, portanto, anti-Israel?
Antes de mais nada, um parênteses engraçado em relação a seu nome. Sua conta no Twitter é @ABlinken, que, para muitos, soa parecido com Abe Lincoln – o icônico 16º presidente americano. Mas, voltando ao que interessa, o que o @ABlinken do século 21 pensa sobre o conflito entre israelenses e palestinos?
Como não poderia deixar de ser, os israelenses que acreditam que Trump foi o “melhor presidente americano para Israel” – apoiando tudo o que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu sugeria – não estão nada felizes. Andam preocupados. Por outro lado, os israelenses que acreditam que Trump exagerou no “apoio” a Israel – enfatizando posições nacionalistas unilaterais e alijando os palestinos – acreditam que Blinken apenas significa a volta das posições diplomáticas tradicionais dos EUA.
Como se sabe, o legado de Trump e Pompeo é ambíguo. Se, por um lado, realmente moderaram acordos de normalização históricos entre Israel e países árabes como Emirados Árabes, Bahrein e Sudão, por outro afastaram qualquer possibilidade negociação de paz com as palestinos ao abertamente hostilizar a liderança de Mahmoud Abbas. Se, por um lado, reconheceram Jerusalém como capital de Israel, por outro insistiram na transferência da embaixada quando o resto do mundo condenava – traçando uma ligação direta entre Israel e um presidente americano mal visto internacionalmente (a não ser pelo presidente brasileiro, claro).
Como, então Antony Blinken vai lidar com o legado de Pompeo e Trump? Filho de sobreviventes do Holocausto, ele se orgulha e não esconde sua ascendência. Então pode-se esperar pelo menos algum entendimento sobre a criação de Israel e o verdadeiro sentido de sionismo. Como um democrata centrista, tem posições mais identificadas com a esquerda em Israel, mas não faz parte do extrema-esquerda do Partido Democrata (que aliás, criticou sua nomeação).
Então, pode-se dizer que ele tenderá a voltar à tradicional posição americana em relação a Israel e ao conflito com os palestinos. Não será um anti-Pompeo total, isto é: alguém que nutre o anti-israelismo parecido a antissemitismo (posição de alguns extremistas democratas).
Blinken se opõe à anexação e à expansão da presença judaica em qualquer parte da Cisjordânia, bem como em Jerusalém Oriental. Ele apoia o estabelecimento de um Estado palestino nessas regiões. No entanto, como bom centrista, ele já disse as seguintes frases: “A ajuda dos EUA a Israel está além do debate e nunca deve ser usada como alavanca para influenciar as políticas de Israel em relação aos palestinos” e “É do interesse dos EUA que Israel tenha meios para se proteger”.
Por um lado, ele disse rejeitar, como Joe Biden, o movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções a Israel (BDS). Por outro, já disse que o governo Biden manterá a embaixada em Jerusalém e apoiará firmemente Israel nas Nações Unidas.
Blinken acredita ser justa a criação de um Estado palestino na Cisjordânia, em Gaza e em Jerusalém Oriental, o que também pouparia Israel de uma calamidade demográfica. Ele acredita na centralidade da questão palestina na agenda árabe, mesmo que isso tenha mudado recentemente com os acordos de paz entre Israel e EAU, Bahrein e Sudão (além de supostas conversas sobre isso com a Arábia Saudita).
Provavelmente, o futuro secretário de Estado americano deve restaurar a ajuda financeira anual à Autoridade Palestina (suspensa no governo Trump em reação ao apoio Autoridade Palestina a famílias de terroristas), bem como a transferência financeira anual para a UNRWA (suspensa devido ao seu financiamento a livros didáticos que incitam ódio a Israel). Ele também deve reabrir o escritório da Organização para Libertação da Palestina (OLP) em Washington, fechado por ordem de Trump.
Em relação ao Irã, Blinken esteve intimamente envolvido na formulação do acordo nuclear de 2015 com Teerã, firmado na gestão Barack Obama. Portanto, ele certamente promoverá o retorno dos EUA no acordo (do qual Trump se retirou).
Em resumo, a gente deve ver, nos próximos quatro anos, a diplomacia tradicional americana de volta a Washington e isso se aplica ao Oriente Médio. Quem gostou de Trump, vai reclamar. Quem não gostou de Trump, vai dizer que é “mais do mesmo”. Depois de uma gestão tão disruptiva na Casa Branca, caberá a Blinken mostrar se diplomacia americana vai apenas voltar atrás ou vai mudar por causa da “chacoalhada” de Trump. Ele terá que criar um novo paradigma, lidar com líderes e conflitos mundiais ao mesmo tempo, com o racha dentro do próprio Partido Democrata. Boa sorte.