Um depoimento sobre a retirada unilateral israelense da Faixa de Gaza

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Cidadãos Israelenses são retirados da Faixa de Gaza por soldados israelenses. Foto de Roni Shitzer.

Esse ano, faz 15 anos do fatídico verão de 2005. Para quem estava em Israel, essa é uma data inesquecível. O calor, o medo, a ansiedade se misturavam na vida do país. Em declaração absolutamente inesperada e pungente, o então primeiro ministro de Israel havia afirmado a intenção de se retirar, de forma unilateral, de Gaza. Ou seja, Ariel Sharon avisava, para os cerca de 7 mil habitantes dos 17 assentamentos da Faixa de Gaza, que eles seriam retirados de suas casas em alguns meses.

Mas não foram apenas eles os afetados. A população de Israel se dividiu: faixas azuis nos braços dos que estavam a favor da retirada de Gaza, faixa laranja nos dos que estavam contra. Carros, casas, pessoas, as cores estavam em todos os lugares. Mas essas posições eram muitos desiguais, os que estavam com as faixas azuis tinham esperança de que a saída de Gaza criasse um modelo de separação com os palestinos, reproduzível na Cisjordânia. Os que estavam com a faixa laranja acreditavam que a desconexão era um projeto de expulsão de judeus de suas casas na Terra de Israel.

A tensão publica era enorme. Parte considerável dos habitantes judeus de Gaza saíram, nos meses anteriores, com plano de desengajamento. Mas outra parte estava lá e se negava a acreditar que isso, de fato, fosse acontecer. Não acreditavam que soldados israelenses iriam retirar israelenses de suas casas. Estavam dispostos a resistir. Não sairiam.

Pessoalmente, minha experiência não foi simples. Eu andava entre os que vestiam laranja e os que vestiam azul, enxergava a retirada unilateral como uma derrota do campo da paz. Não tinha havido acordo, Sharon havia decidido se retirar de Gaza, o que, a meu ver fortaleceria o Hamas, ignorando os acenos da Autoridade Nacional Palestina. Por outro lado, imaginava ser impossível manter israelenses na Faixa de Gaza.

Além disso, a experiência de ver judeus sendo retirados de suas casas por soldados israelenses prometia não ser simples, e as coisas caminhavam para isso. Não eram poucas as vozes que alertavam para a possibilidade de uma Guerra Civil, com milhares de judeus, ligados à comunidade nacional religiosa, tentando invadir a região, virtualmente impelindo soldados a reagir violentamente. Os prognósticos eram terríveis.

Na semana da retirada, uma multidão se concentrava em uma pequena cidade na fronteira entre Israel e a Faixa de Gaza, Kfar Maimon. Ameaçavam invadir. Imagens diretas da região davam ideia da tensão e do desespero, qualquer decisão equivocada levaria a mortos e feridos. Como as pessoas estavam desesperadas com a perspectiva do que eles chamavam de expulsão, isso era possível de acontecer. Não aguentei ficar de longe, viajei para Kfar Maimon. As cenas de desespero e raiva eram indescritíveis. A impressão era que o pior aconteceria.

Depois de três dias, uma figura que eu conhecia bem, Rabino Him Drukman (meu antigo professor) se aproximara da multidão. Os gritos pela invasão ficavam mais fortes. O rabino subiu em um palco montado, quase sem dizer uma palavra, rasgou a roupa em sinal de luto (estávamos na semana de Tisha Beav- luto nacional judaico) e, chorando, recitou um kadish. Depois de terminar, falou sobre o valor da vida e pediu, com a voz embargada, que todos voltassem para casa para guardar o luto de forma respeitosa nos lares.

Essa, talvez, tenha sido a maior lição de liderança que tive na vida. Não era parte daquele grupo, mas senti a dor coletiva de todos eles e entendi a importância de um líder responsável na hora necessária.

Dias depois, os judeus eram tirados dos assentamentos de Gaza. Casas, sinagogas e cemitérios eram esvaziados sob musica, choros e preces, em cenas que precisam ser contadas. Entre agosto e setembro de 2005 Israel presenciou uma das cenas mais traumáticas de sua história.

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