A nona aula do curso de formação do IBI no Rio de Janeiro foi ministrada no domingo, 11/11, pelo professor Luís Edmundo Moraes, graduado em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em Antropologia Social pela mesma instituição e doutor em História pelo Centro de Pesquisas Sobre o Antissemitismo da Universidade Técnica de Berlim. A questão central da aula foi “antissemitismo e racismo”.
O movimento geral da aula foi de historicização do antissemitismo, rejeitando sua dimensão eterna, a histórica, como o ódio mais antigo de todos. Pra isso foi necessário distinguir a palavra antissemitismo de seu fenômeno para pensar então se coincidem.
A palavra foi criada no século XIX num contexto de discussão sobre línguas semíticas, mas rapidamente, no final do século XIX, adotou sem sombras de dúvida seu significado relacionado com judeus. Mas não era uma palavra de denúncia, era inclusive uma palavra mobilizada por políticos e organizações civis para descreverem a si mesmos como algo valoroso. Isso era intimamente associado a movimento nacionalistas e a uma visão (pseudo)científica de mundo, que que o via por meio de raças. Assim, a raça semítica, judaica, era um problema para a pureza da raça branca. A miscigenação seria um caminho para degeneração racial e o contato com judeus e outros grupos marcados por esse estigma devia ser evitado e vigiado.
Desta maneira, o que se buscava combater e excluir no antissemitismo moderno era algo inescapável aos judeus: não se podia deixar de ser judeu. O que é bastante diferente das formas de exclusão pre-modernas, cristãs e religiosas, que afastavam judeus e faziam proibições, mas por suas práticas judaicas. Se abandonadas, se houvesse conversão, havia possibilidades para os judeus. Mas no antissemitismo moderno não, cumprir ou não as práticas não mudava nada.
Essa visão é constitutiva do pensamento racista dos séculos XIX e XX. Todavia, como vimos com o professor num passeio por diferentes usos do conceito, ele possui múltiplos sentidos dados somente pelos agentes e contextos. Desta forma, é interessante distinguir antissemitismo enquanto conceito analítico e conceito nativo. Ou seja, compreender seus usos depende dos agentes e dos contextos. No passeio pelos sentidos do uso da palavra antissemitismo, enquanto conceito nativo, vimos que foi usado tanto de forma positiva para se autoreferir, quanto para denúncias institucionais, como crime, como forma de mobilização comunitária. E todos esses usos são eficazes para seus propósitos, mostrando a múltipla operacionalidade do conceito.
Contudo, enquanto conceito analítico, Luís Edmundo propôs caracterizar o antissemitismo em sua dimensão racial, conectado e partilhando da mesma estrutura que outras formas de exclusão. Trata-se de pensar os judeus como uma corporação, como um corpo único, de forma que não há diferenças entre um judeu e todos os judeus: todos equivalem entre si. E essa judaidade corporativa seria marcada como negativa, ameaçadora, degenerada. Desta forma, a presença judaica seria o tema de discursos conspiracionistas, que buscam extirpar esse corpo estranho.
Assim, é possível pensar o antissemitismo em suas múltiplas dimensões, usos, sentidos e conexões. Estudar antissemitismo é estudar racismo e suas constantes transformações das formas de exclusão.