A Olimpíada é mais do que esporte para Israel: é geopolítica

Ilana Romano segura foto de seu marido, Yoseph, morto no ataque em Munique, em 1972. (Foto: Daniela Kresch – Dezembro 2015)

TEL AVIV – Os jogos olímpicos são mais do que uma competição esportiva para os israelenses. O evento internacional sempre teve um peso político para o país. Só o fato de ser uma nação competindo na mesma arena com outras nações é algo que pesa no orgulho nacional de um país que, até hoje, 73 anos depois de seu estabelecimento, não tem relacionamento diplomático com dezenas de Estados. Fora isso, o tratamento dispensado a atletas israelenses sempre é algo tão ou mais relevante do que o número de medalhas conquistadas.

A cada olimpíada, sempre há algum incidente diplomático envolvendo a delegação israelense. Este ano, por exemplo, dois judocas (um do Sudão e outro da Argélia) se retiraram da competição só para não lutar contra um oponente de Israel.

Também teve o caso do judoca Saeid Mollaei, um dissidente iraniano que participou dos jogos em Tóquio representando a Mongólia e que dedicou sua medalha de prata a Israel. O mesmo Mollaei fora obrigado pelo governo iraniano a abandonar uma competição, em 2019, para não lutar contra o judoca israelense Sagi Muki na final. Agora, dois anos depois de deixar o Irã e se tornar amigo de Muki, ele disse “todá rabá” em hebraico e dedicou a medalha aos israelenses.

Muitas vezes, há casos de antissemitismo durante os jogos. Mas, certamente, o maior incidente envolvendo Israel aconteceu nas Olimpíadas de Munique, em 1972, quando o grupo terrorista palestino Setembro Negro sequestrou e assassinou 11 atletas israelenses.

Em 2015, fiz uma entrevista emocionante com Ilana Romano, viúva do levantador de pesos Yoseph Romano, que foi castrado e morto diante de seus colegas de delegação antes de os outros também serem torturados e mortos pelos terroristas – a maioria deles após uma tentativa fracassada das forças de segurança alemãs para libertá-los.

Na época, pouco antes dos Jogos Olímpicos do Rio, Ilana implorava ao Comitê Olímpico Internacional (COI) para que realizasse um minuto de silêncio na abertura da competição em lembrança da maior tragédia ocorrida durante uma olimpíada. 

Por mais de quatro décadas, o COI se recusava a lembrar os mortos durante a abertura oficial dos jogos. No Rio, pela primeira vez, houve uma espécie de monumento na vila olímpica e um “momento” de luto no encerramento lembrando todos que perderam as vidas durante os jogos. 

Mas Ilana queria mais: um minuto de silêncio na abertura oficial – assistida por milhões de pessoas pelo mundo – lembrando esse ataque terrorista terrível. Afinal, seu marido não morreu de causas naturais, competindo ou treinando. Morreu num ataque terrorista dentro da vila olímpica, de responsabilidade do COI.

Este ano, em Tóquio, finalmente Ilana, hoje com 75 anos de idade, conseguiu o que queria depois de 49 anos de luta. As vítimas israelenses do massacre de 1972 foram homenageadas na abertura das olimpíadas com um momento de silêncio. A delegação israelense foi especificamente mencionada. Também houve uma apresentação de dança em homenagem aos mortos.

“Em particular, nos lembramos daqueles que perderam suas vidas durante os jogos olímpicos”, disse o locutor. “Um grupo ainda ocupa um lugar forte em todas as nossas memórias e representa todos aqueles que perdemos nos jogos: os membros da delegação de Israel nos Jogos Olímpicos de Munique 1972”. 

“Finalmente, há justiça para os maridos, filhos e pais assassinados em Munique”, disse Ilana Romano, juntamente com outra viúva, Ankie Spitzer, ambas presentes na abertura dos jogos, no Japão. “Passamos 49 anos de luta e nunca desistimos. Não podemos conter nossas lágrimas. Este é o momento que esperávamos”. 

Minha pergunta sempre foi: por quê? Por que não lembrar os mortos pelo terrorismo a cada edição das olimpíadas (ou pelo menos uma vez que fosse)? Será porque os mortos eram judeus, eram israelenses? Há que diga que sim. Talvez não por um antissemitismo “clássico”, mas para evitar um “mal-estar” com países árabes ao relembrar os mortos israelenses. O COI, afinal, sempre afirmou que as olimpíadas não devem ser politizadas, isso apesar de todos os boicotes da Guerra Fria, do afastamento dos atletas sul-africanos na época do Apartheid e de tantos outros exemplos. 

No final das contas, os Jogos Olímpicos da modernidade podem tentar colocar o esporte acima da geopolítica. Mas é uma luta inglória. Em qualquer lugar onde vários grupos – ou nações – se reúnam, com os olhos do mundo voltados a eles, há potencial de tensão entre os grupos ou dentro deles. Em 2015, Ilana Romano alertava para essa tentativa de varrer para debaixo do tapete as mortes dos atletas israelenses:

“Se o COI não condenar com veemência, os terroristas vão achar que podem tudo. O terrorismo moderno nasceu em 1972, com Munique. E no momento em que ele conseguiu tanto sucesso, não parou”, disse Ilana. “Todo terrorista vai te dizer que é um ‘lutador pela paz’, mas eu os chamo de assassinos brutais, sem resquício de Humanidade. O mundo precisa enfrentar e atacar o terrorismo em todos os cantos do mundo. Não se pode deixar o terrorismo vencer a Humanidade”.

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